Em 1997 viajámos pela mão do António Feio à Ilha do Corvo, numa adaptação (sua) de um texto de Martin McDonagh. Um texto simultaneamente comovente e hilariante, um trabalho com muitas risadas garantidas.
Primeiro ensaio, primeiro acto, cena 1: As actrizes entram em cena e proferem as duas primeiras frases do texto. O encenador levanta-se e diz calmamente: “Ok. Vamos parar.”
Mau– pensamos– a este ritmo não chegamos à estreia!
O António põe-se ao nosso lado e mostra-nos porque é que estamos a começar mal. Mostra-nos com o corpo, mostra-nos com os olhos, porque antes de ser encenador ele é um actor que encena. Não nos mostra “como se faz”, mostra-nos pessoas e emoções, e na sua figura alta e fininha vemos aparecer uma angustiada velhota de 60 anos, um puto armado em carapau-de-corrida, um solteirão coscuvilheiro de aldeia. E tudo começa a funcionar, e tudo começa a ser comovente e hilariante. E, apesar dos ocasionais empandeiranços e faralhanços, é um trabalho cheio de risadas– as nossas e depois as do público. Desmente a gente procure o rigor e a verdade e (sempre) o prazer de fazer.
“O António Feio deixou-nos para sempre.”
Nós aqui preferimos meter uma sardinha...
O António Feio vive para sempre.
Obrigado!